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Abutre-preto foi a voz da biodiversidade em conferência sobre energias renováveis

O projeto LIFE Aegypius Return foi convidado a clarificar alguns dos mitos sobre a compatibilização da energia renovável e do ambiente num evento que reuniu os principais stakeholders da transição energética em Portugal, incluindo muitos representantes da indústria. 

4º Posto de Transformação da EMER ©VCF 
4º Posto de Transformação da EMER ©VCF 

Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projetos de Energias Renováveis 2030 

Em março de 2024, o Governo português criou a Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projetos de Energias Renováveis 2030 (EMER 2030), com o objetivo de centralizar e agilizar o licenciamento de projetos de energias renováveis no país. Esta medida insere-se no compromisso nacional com a aceleração da transição climática e energética, conforme previsto na primeira revisão do Plano Nacional de Energia e Clima 2030 (PNEC 2030). 

A EMER tem por missão assegurar uma atuação coordenada e eficaz no cumprimento das metas definidas no PNEC 2030, promovendo a integração das energias renováveis no sistema elétrico nacional. Para tal, procura simplificar os procedimentos de licenciamento, reforçar a transparência administrativa e propor medidas que garantam a sustentabilidade energética e financeira da transição em curso. 

 


4º Posto de Transformação 

Com o intuito de capacitar as entidades públicas envolvidas no licenciamento de projetos de energia renovável, a EMER tem vindo a organizar eventos formativos denominados "Posto de Transformação", que reúnem os principais stakeholders do setor: autoridades e decisores, promotores, consultores e outros especialistas. 

A 4 de novembro decorreu o 4º Posto de Transformação, sob o tema “mitos da energia e do ambiente”, e contou com mais de 300 participantes. 

O programa incluiu apresentações sobre autoconsumo e comunidade de energia, redes de transporte, digitalização, regulamentação do setor e mercado do carbono.  

As autoridades envolvidas, designadamente a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e o Instituto para a Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), apresentaram uma contextualização sobre a energia renovável em Portugal, as taxas de aprovação de projetos, e os respetivos desafios na avaliação e licenciamento. 

A conservação da natureza, embora tenha sido mencionada de forma transversal nas várias apresentações, esteve representada pelo projeto LIFE Aegypius Return, dedicado à conservação do abutre-preto (Aegypius monachus), e pela Vulture Conservation Foundation (VCF), a entidade coordenadora do projeto.  

As preocupações com a avifauna foram igualmente sublinhadas pela REN - Redes Energéticas Nacionais, que apresentou 25 anos de progressos na compatibilização entre os sistemas de transporte de energia e a conservação das aves. 



Mitos, impactos e soluções 

Entre os temas debatidos no 4.º Posto de Transformação destacaram-se: 

  • condicionantes formais à instalação de projetos de energia renovável; 

  • a descentralização da produção energética; 

  • impactos da energia “limpa”; 

  • soluções técnicas para mitigar impactos; 

  • descarbonização e neutralidade carbónica. 

 

É consensual que nenhuma forma de produção de energia renovável, nem o respetivo sistema de transporte (linhas elétricas), está totalmente isenta de impactos negativos, nomeadamente sobre a biodiversidade. Estas infraestruturas são causas de mortalidade reconhecidas para aves (e outras espécies voadoras), especialmente as de grande porte, como os abutres. Em determinadas circunstâncias e contextos, esta mortalidade poderá ter consequências a nível da demografia de algumas populações, como amplamente evidenciado pela literatura científica. 

Só em Portugal, no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return já se registou a morte de pelo menos um abutre-preto juvenil por colisão com linhas elétricas, no Douro Internacional, e, desde 2010 já foram registados nove casos de mortalidade por eletrocussão. Dezenas de grifos têm também morrido em colisões com aerogeradores em vários parques eólicos do país, nos últimos anos. 


Abutre-preto morto por eletrocussão em linha elétrica. ©Quercus 
Abutre-preto morto por eletrocussão em linha elétrica. ©Quercus 

No caso de espécies com reprodução tardia, posturas de ovo único e colónias reprodutoras diminutas e relativamente isoladas, como o abutre-preto, a perda de um único indivíduo pode acarretar impactos bastante significativos e, no limite, comprometer a viabilidade da respetiva colónia reprodutora.  

As medidas de prevenção e mitigação do risco são, por isso, essenciais para garantir a sustentabilidade ambiental dos projetos. Uma avaliação rigorosa dos riscos exige diálogo permanente com as organizações que atuam no terreno e conhecem a ecologia das espécies mais vulneráveis — como o LIFE Aegypius Return, no caso do abutre-preto, o LIFE SOS Pygargus, centrado no tartaranhão-caçador (Circus pygargus), entre outros exemplos. 

Para além da mortalidade potencial, há ainda que considerar as ameaças indiretas à biodiversidade que os projetos de produção de energia renovável podem acarretar, tal como efeitos de exclusão pela perda de habitat de alimentação, repouso ou nidificação.  

Todos estes aspetos devem ser amplamente discutidos entre as partes interessadas, de forma a encontrar soluções de compromisso que evitem ou reduzam riscos e também medidas eficazes para a compensação dos impactos inevitáveis. 



Energias renováveis e o abutre-preto 

Os parceiros LIFE Aegypius Return têm vindo a desenvolver e divulgar orientações técnicas que visam conciliar a expansão das energias renováveis com a conservação do abutre-preto, espécie ameaçada e prioritária, em termos de conservação. Reiteram, nesse sentido, a sua disponibilidade para um diálogo transparente e construtivo com todas as partes envolvidas, para procurar soluções sustentáveis e equilibradas, que permitam a necessária transição energética, de forma a diminuir a crise climática, sem que a mesma agrave a crise da perda da biodiversidade. 

O projeto acompanha atentamente o desenvolvimento de novos empreendimentos de energia renovável que possam afetar o abutre-preto, com especial atenção aos que se localizam próximos das colónias de Vidigueira/Portel e do Tejo Internacional. Estas são, respetivamente, as colónias mais recente e mais antiga, e ambas são estratégicas para a conservação da espécie e para a conectividade das várias colónias reprodutoras.  

Até ao momento, no âmbito do projeto, foram emitidos cerca de quarenta pareceres técnicos, baseados em evidência científica, que incluem dados sobre movimentos das dezenas de aves marcadas com emissores GPS/GSM, informação de nidificação, projeções de expansão das colónias e avaliações dos potenciais impactos dos projetos, acompanhadas de propostas de mitigação e redução de riscos. A generalidade desses pareceres tem sido no sentido de viabilizar os projetos, geralmente com recomendações de alteração de projeto para salvaguardar os abutres-pretos, mas alguns casos incluíram a recomendação de reprovação do projeto, por se considerar que teria impactos demasiados graves sobre a espécie. 

Na apresentação feita durante o Posto de Transformação, foi ainda destacada a experiência internacional da VCF na mitigação de ameaças e no diálogo com o setor energético noutras regiões da Europa. 


Abutre-preto com parque eólico de fundo © Bruno Berthemy 
Abutre-preto com parque eólico de fundo © Bruno Berthemy 

Orientações para o futuro 

O 4.º Posto de Transformação constituiu uma oportunidade para avaliar o estado atual dos diversos temas debatidos e identificar caminhos de melhoria. Entre as propostas discutidas destacam-se a criação de espaços regulares de diálogo e o desenvolvimento de plataformas digitais de partilha de informação, incluindo sistemas de informação geográfica que centralizem dados sobre projetos em diferentes fases de planeamento e execução, e permitam uma avaliação coerente dos impactos cumulativos sobre espécies ameaçadas ou sensíveis à perturbação.  

A transição energética é essencial e representa um aliado estratégico no combate à crise climática. No entanto, a crise da biodiversidade – que agrava a própria crise climática – não pode ser desvalorizada. A construção de soluções conjuntas através da cooperação intersectorial será a chave para uma sustentabilidade plena – social, ambiental e económica. 

 



 

 
 
 

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